26 de abr. de 2015

Crise de existência em redes sociais

Sinto saudade dos tempos do Orkut, anos 00, que podíamos discutir as ideias, ser xingado de N maneiras e a conversa ainda continuava até alguém cansar. Agora, qualquer coisa já te encaixam em "coxinha" ou "esquerdopata" e nada do que você diga será interpretado mais, a conversa virará um loop nonsense.

Não, o problema não é ser dito como de direita ou de esquerda quando você realmente o é, é lidar com quem já usa essas expressões há tanto tempo que nem reflete mais sobre esse uso e ao mesmo tempo só é capaz de repetir decorado o que os famosinhos da web disseram e marcaram. A pessoa está te chamando de burro e o crlh a 4 enquanto está simplesmente REPETINDO o que leu porcamente por aí, sem ler uma vírgula do que você tá dizendo, como se pensasse ser o paladino da verdade. E muitas vezes não estamos nem mesmo demonstrando nossa tendência política. 

Enfim, confesso que gostaria que me dissessem se já fui boçal assim, para lembrar desse passado idiota pra não repetir e nem ficar soberba em relação a essa galerinha. Sozinha já lembro que repeti muito o que diziam sem refletir, como se corresse para aparentar ter uma opinião porque era a única que não tinha ainda. Hoje em dia me arrisco, se não sei, não sei. Entre ter opinião dissimulada e ficar quebrando a cabeça para entender alguns fenômenos, prefiro ir pelo caminho mais difícil mas mais honesto.

24 de jan. de 2015

Álvaro de Campos
Dois Excertos de Odes
  (FINS DE DUAS ODES, NAIURALMENTE)
 

 
                                                       I     
   Vem, Noite antiquíssima e idêntica,  
   Noite Rainha nascida destronada,  
   Noite igual por dentro ao silêncio, Noite  
   Com as estrelas lentejoulas rápidas  
   No teu vestido franjado de Infinito. 
   Vem, vagamente, 
   Vem, levemente, 
   Vem sozinha, solene, com as mãos caídas 
   Ao teu lado, vem 
   E traz os montes longínquos para o pé das árvores próximas, 
   Funde num campo teu todos os campos que vejo, 
   Faze da montanha um bloco só do teu corpo, 
   Apaga-lhe todas as diferenças que de longe vejo, 
   Todas as estradas que a sobem, 
   Todas as várias árvores que a fazem verde-escuro ao longe. 
   Todas as casas brancas e com fumo entre as árvores, 
   E deixa só uma luz e outra luz e mais outra, 
   Na distância imprecisa e vagamente perturbadora,  
   Na distância subitamente impossível de percorrer. 
   Nossa Senhora 
   Das coisas impossíveis que procuramos em vão, 
   Dos sonhos que vêm ter conosco ao crepúsculo, à janela,  
   Dos propósitos que nos acariciam 
   Nos grandes terraços dos hotéis cosmopolitas 
   Ao som europeu das músicas e das vozes longe e perto,  
   E que doem por sabermos que nunca os realizaremos...  
   Vem, e embala-nos, 
   Vem e afaga-nos. 
   Beija-nos silenciosamente na fronte, 
   Tão levemente na fronte que não saibamos que nos beijam  
   Senão por uma diferença na alma. 
   E um vago soluço partindo melodiosamente 
   Do antiquíssimo de nós 
   Onde têm raiz todas essas árvores de maravilha 
   Cujos frutos são os sonhos que afagamos e amamos 
   Porque os sabemos fora de relação com o que há na vida. 
   Vem soleníssima, 
   Soleníssima e cheia 
   De uma oculta vontade de soluçar, 
   Talvez porque a alma é grande e a vida pequena, 
   E todos os gestos não saem do nosso corpo 
   E só alcançamos onde o nosso braço chega, 
   E só vemos até onde chega o nosso olhar. 
   Vem, dolorosa, 
   Mater-Dolorosa das Angústias dos Tímidos, 
   Turris-Eburnea das Tristezas dos Desprezados, 
   Mão fresca sobre a testa em febre dos humildes, 
   Sabor de água sobre os lábios secos dos Cansados. 
   Vem, lá do fundo 
   Do horizonte lívido, 
   Vem e arranca-me 
   Do solo de angústia e de inutilidade 
   Onde vicejo. 
   Apanha-me do meu solo, malmequer esquecido, 
   Folha a folha lê em mim não sei que sina 
   E desfolha-me para teu agrado, 
   Para teu agrado silencioso e fresco. 
   Uma folha de mim lança para o Norte, 
   Onde estão as cidades de Hoje que eu tanto amei; 
   Outra folha de mim lança para o Sul, 
   Onde estão os mares que os Navegadores abriram; 
   Outra folha minha atira ao Ocidente, 
   Onde arde ao rubro tudo o que talvez seja o Futuro, 
   Que eu sem conhecer adoro; 
   E a outra, as outras, o resto de mim 
   Atira ao Oriente, 
   Ao Oriente donde vem tudo, o dia e a fé, 
   Ao Oriente pomposo e fanático e quente, 
   Ao Oriente excessivo que eu nunca verei, 
   Ao Oriente budista, bramânico, sintoísta, 
   Ao Oriente que tudo o que nós não temos, 
   Que tudo o que nós não somos, 
   Ao Oriente onde — quem sabe? — Cristo talvez ainda hoje viva, 
   Onde Deus talvez exista realmente e mandando tudo... 
   Vem sobre os mares, 
   Sobre os mares maiores, 
   Sobre os mares sem horizontes precisos, 
   Vem e passa a mão pelo dorso da fera, 
   E acalma-o misteriosamente, 
   ó domadora hipnótica das coisas que se agitam muito! 
   Vem, cuidadosa, 
   Vem, maternal, 
   Pé ante pé enfermeira antiquíssima, que te sentaste 
   À cabeceira dos deuses das fés já perdidas, 
   E que viste nascer Jeová e Júpiter, 
   E sorriste porque tudo te é falso é inútil. 
   Vem, Noite silenciosa e extática, 
   Vem envolver na noite manto branco 
   O meu coração... 
   Serenamente como uma brisa na tarde leve, 
   Tranqüilamente com um gesto materno afagando. 
   Com as estrelas luzindo nas tuas mãos 
   E a lua máscara misteriosa sobre a tua face. 
   Todos os sons soam de outra maneira 
   Quando tu vens. 
   Quando tu entras baixam todas as vozes, 
   Ninguém te vê entrar. 
   Ninguém sabe quando entraste, 
   Senão de repente, vendo que tudo se recolhe, 
   Que tudo perde as arestas e as cores, 
   E que no alto céu ainda claramente azul 
   Já crescente nítido, ou círculo branco, ou mera luz nova que vem. 
   A lua começa a ser real. 
                                                       II 
   Ah o crepúsculo, o cair da noite, o acender das luzes nas grandes cidades  
   E a mão de mistério que abafa o bulício, 
   E o cansaço de tudo em nós que nos corrompe 
   Para uma sensação exata e precisa e ativa da Vida! 
   Cada rua é um canal de uma Veneza de tédios 
   E que misterioso o fundo unânime das ruas, 
   Das ruas ao cair da noite, ó Cesário Verde, ó Mestre,  
   Ó do "Sentimento de um Ocidental"! 

   Que inquietação profunda, que desejo de outras coisas, 
   Que nem são países, nem momentos, nem vidas, 
   Que desejo talvez de outros modos de estados de alma 
   Umedece interiormente o instante lento e longínquo! 

   Um horror sonâmbulo entre luzes que se acendem, 
   Um pavor terno e líquido, encostado às esquinas 
   Como um mendigo de sensações impossíveis 
   Que não sabe quem lhas possa dar ... 

   Quando eu morrer, 
   Quando me for, ignobilmente, como toda a gente,  
   Por aquele caminho cuja idéia se não pode encarar de frente,  
   Por aquela porta a que, se pudéssemos assomar, não assomaríamos  
   Para aquele porto que o capitão do Navio não conhece,  
   Seja por esta hora condigna dos tédios que tive,  
   Por esta hora mística e espiritual e antiquíssima, 
   Por esta hora em que talvez, há muito mais tempo do que parece,  
   Platão sonhando viu a idéia de Deus 
   Esculpir corpo e existência nitidamente plausível.   
   Dentro do seu pensamento exteriorizado como um campo. 

   Seja por esta hora que me leveis a enterrar,  
   Por esta hora que eu não sei como viver, 
   Em que não sei que sensações ter ou fingir que tenho,  
   Por esta hora cuja misericórdia é torturada e excessiva,  
   Cujas sombras vêm de qualquer outra coisa que não as coisas,  
   Cuja passagem não roça vestes no chão da Vida Sensível  
   Nem deixa perfume nos caminhos do Olhar. 

  Cruza as mãos sobre o joelho, ó companheira que eu não tenho nem quero ter. 
  Cruza as mãos sobre o joelho e olha-me em silêncio 
  A esta hora em que eu não posso ver que tu me olhas, 
  Olha-me em silêncio e em segredo e pergunta a ti própria 
  — Tu que me conheces — quem eu sou ...

30 de jul. de 2014

"No decorrer de sua vida essas mulheres transformaram a imagem que justificava a degradação feminina. Numa reunião, enquanto os homens zombavam da ideia de confiar o voto a mulheres tão indefesas que precisavam de ajuda para subir a uma carruagem ou saltar sobre uma poça de lama, uma orgulhosa feminista chamada Sojourner Truth ergueu seu negro braço:

'Olhem para meu braço! Cavei, plantei, colhi... e não sou mulher? Era capaz de trabalhar e comer tanto quanto um homem - depois que consegui isto - e também suportar o açoite... Tive treze filhos e vi a maioria vendidos como escravos. E quando chorei a noite pela dor que já foi a de minha mãe, ninguém sendo Jesus me ajudou - e não sou mulher?'"


(Mística Feminina - Betty Friedan, p. 84-85)

20 de jun. de 2014

Estava lendo um texto de Heidegger pela segunda vez, para fazer trabalho, e acho magnífico nossa capacidade de entender melhor um texto ao reler depois de um tempo, depois de algumas experiências adquiridas, é o ficar mais sábio na prática. Preciso sempre lembrar disso para estudar, a matéria ficará apaixonante depois de alguns meses.

Ironicamente meu professor citou esse fenômeno também, serviu para eu perceber sobre meu próprio aprendizado ou sobre o que é a vida: esse eterno desenvolver.

Isso tudo me levou ao outro momento, que é melhor ser exposto em outra postagem.

Morada

O aluguel está muito alto. Mais alto que o salário mínimo. Quem recebe o mínimo mora onde? Num lote com mais três casas? Não, barracos, como diz minha mãe.
Quem vive de mínimo não merece ter a visão da rua pela  própria janela, ofuscada  por outros moradores de mínimo. Ofuscada de verdade pelos que não vivem de mínimo, quem vive de algo mais o sugamento da necessidade de outros de ter um teto, mesmo que custe cada vez mais caro.


Enquanto escrevia, na tv saiu:

"direito de se inscrever em projetos habitacionais"
Foi um alívio reencontrar esse blog. Ando meio acuada, engasgada, não me sinto livre para dizer o que penso - como outrora já aconteceu -, queria dizer o que penso, mas me sinto incomodando, sendo incoveniente espalhando esses pensamentos meio conturbados nas redes sociais enquanto aquelas pessoas só querem relaxar e ver graça da vida, além de quando odeiam o que digo. Que bom poder falar.

Acho que esse é o melhor reencontro do ano.

6 de abr. de 2012

O que uma graduação tensa não faz... Tanta negligência, me fez estar mais atolada que tudo.
Não leio e nem penso em mais nada além de Biologia. Ok, eu amo isso, mas está sufocando.